terça-feira, 15 de março de 2011

Mário Covas: um exemplo de político de quem o Brasil ainda tem saudades

Missa em São Paulo lembrou os 10 anos da morte do “prefeito que gostava da pobreza”


- Esta é a mulher do prefeito que gosta da pobreza.

Mais de 20 anos depois, Lila Covas, viúva do ex-governador Mário Covas, ainda se lembra de como foi apresentada pelo padre Rosalvino aos fiéis de uma igreja no bairro de Itaquera, na Zona Leste de São Paulo, em 1984. Era Dia das Mães e Lila estava a caminho de uma reunião com um clube de mães daquele bairro. O motorista se perdeu no caminho e ela entrou na igreja para pedir ajuda. Acabou sendo levada para o altar pelo padre que a apresentou às crianças e jovens que estavam tendo uma aula de catecismo.

Essas e outras histórias de Mário Covas foram lembradas por colaboradores do ex-governador de São Paulo e fundador do PSDB na missa pelos 10 anos de sua morte, celebrada dia 12, no Mosteiro de São Bento, em São Paulo.

Inovação, firmeza, coerência e coragem foram alguns princípios que comandaram a vida pessoal e política de Covas.

Em seu segundo mandato como deputado federal, foi eleito líder do então MDB naquela Casa em 1967. E não hesitou em combater a ditadura que se instalara em 1964. Opôs-se à Lei de Imprensa do então presidente Castelo Branco. Foi às ruas da capital federal para defender os estudantes da UnB, quando se tornou amigo pessoal do então presidente do DCE Livre da universidade, Honestino Guimarães, que foi preso e morto pela repressão.

Com o mandato cassado, foi preso duas vezes. Libertado, foi irônico ao comentar as perguntas feitas pelos militares na cadeia. Covas dizia que não entendia mais nada de sua prisão, já que as perguntas poderiam ser respondidas pelo telefone com uma frase simples: “Claro que fiz tudo isso: eu era o líder da oposição da Câmara.”

Prefeito nomeado de São Paulo, Covas decidiu que sua administração seria voltada para a periferia da capital.

Uma de suas medidas inovadoras foram os mutirões de limpeza e asfaltamento de ruas na periferia. A Prefeitura entrava com os equipamentos. As associações de moradores indicavam as ruas que mais precisavam de asfalto. Os moradores trabalhavam aos fins de semana com os funcionários da Prefeitura sob o olhar atento do prefeito, que sempre acompanhava os mutirões.

“A reivindicação de pavimentação na periferia desta cidade – dizia – não é apenas a rejeição a pisar na lama. Significa, antes, a consciência de que é um fator de segurança, pois a pavimentação garante a chegada do ônibus no bairro, a entrada do carro de polícia, da coleta de lixo e da ambulância.”

Covas também se preocupou com a educação e adotou três medidas inovadoras. Os diretores das escolas municipais passaram a ser eleitos por alunos e professores. Um conselho escolar de pais e alunos começou a acompanhar a execução de pequenas obras em cada estabelecimento de ensino com o dinheiro que era entregue diretamente a cada escola.

Preocupado com o elevado número de depredação de escolas na periferia durante os fins de semana, Covas determinou que elas ficassem abertas aos sábados e domingos. Um estudo da Prefeitura revelou que os ataques ocorriam principalmente nos bairros onde não havia lazer. Ali, as quadras escolares ficavam fechadas nesses dias, provocando revolta.

Ao fim dos 33 meses de sua administração, mais 178.300 crianças estavam nas salas de aula. A rede de ensino contava com 31 novas escolas de primeiro grau e 64 de educação infantil. Isso representou um aumento de 25% no número de vagas no primeiro grau e de 66% na educação infantil.

A criação do passe gratuito dos idosos no sistema de transporte público de São Paulo foi uma das medidas mais revolucionárias da administração Covas.

O prefeito descobriu que milhares de aposentados de baixa renda da Previdência Social viviam numa situação de verdadeiro “apartheid” econômico e social na cidade. O “apartheid” econômico se devia ao fato de que essas aposentadorias eram usadas para a complementação de renda dos filhos casados desses aposentados. O “apartheid” social era uma conseqüência disso: sem dinheiro, esses idosos eram obrigados a ficar em casa.

Foi então que surgiu a idéia do passe gratuito para os idosos com mais de 65 anos. Como sempre, as empresas de ônibus chiaram, alegando que os ônibus ficariam ainda mais superlotados. A Prefeitura respondeu informando que esses idosos, como eram aposentados, nunca viajariam nos horários de pico, preferindo o período em que os ônibus estariam vazios.

Em 1989, candidato à Presidência da República, Covas lembrou, com muito humor, o dia em que os guichês da então Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC) se abriram para emitir os primeiros passes gratuitos. O prefeito, secretários e assessores mais imediatos suavam frio quando chegaram numa dessas filas. Ninguém sabia como os idosos reagiriam ao passe gratuito. Previdente, a Secretaria dos Transportes da Prefeitura determinara a distribuição de água, café e balas nas filas.

Os temores de Covas e seus assessores foram desnecessários. Os velhinhos estavam encantados com a recuperação do seu direito e ir e vir. E muitas aposentadas abraçaram e beijaram o prefeito. A batalha tinha sido vencida e, em meses, mais de 250 mil idosos na cidade já dispunham de seu passe.

O passe do idoso de São Paulo se tornaria um movimento vitorioso na Constituinte de 1988. Foi de autoria do então senador Mário Covas a redação do artigo 230 (parágrafo 2o.) que estendeu a gratuidade dos transportes urbanos coletivos de todo o país a essas pessoas.

Eleito senador em 1986, com uma votação recorde em todo o país (mais de 6 milhões de votos), tornou-se líder do PMDB na Constituinte e foi um dos articuladores da mais democrática e progressista Constituição que o Brasil já teve.

Foi um dos fundadores do PSDB junto com Franco Montoro, Fernando Henrique, José Richa e Euclides Scalco, em 1988, tornando-se candidato à Presidência da República, em 1989.

Eleito governador de São Paulo, em 1994, saneou as finanças estaduais, reorganizou a administração pública, privatizou estatais e estradas estaduais. Foi reeleito em 1998 e, mesmo abatido pela doença, insistiu em comandar o Estado até o último instante.

Dez anos depois da sua morte em 06 de março de 2001 , sua falta ainda é sentida pelos brasileiros.

Texto: Tadeu Afonso

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